Revolução Russa (2 de 6) : Domingo Sangrento e Primeira Guerra Mundial


Em 1905 a insatisfação em relação ao regime czarista explodiria. Tendo em vista suas ambições industriais e imperialistas, a Rússia se envolveu em uma guerra com o Japão tendo em vista os territórios da Manchúria e da Coréia. A derrota da Rússia para o Japão na guerra de 1904-5 (Guerra Russo-Japonesa) agravou a situação econômica interna e desencadeou uma série de manifestações populares – com ampla participação do proletariado. Várias organizações de operários – os chamados sovietes – começaram a se formar em inúmeras cidades russas.


No dia 9 de janeiro de 1905 milhares de pessoas se mobilizaram de forma pacífica em São Petersburgo (pelo menos 300 mil pessoas) com a finalidade de reivindicar melhorias das condições de trabalho, reforma agrária, tolerância religiosa e maior representatividade popular. Apesar do apelo ao czar russo a manifestação foi duramente reprimida, ocasionando a morte de centenas de pessoas e milhares de feridos, o episódio ficou conhecido com o nome emblemático de Domingo Sangrento.


No domingo, dia 9 de janeiro, o padre Gapon – descrito pelo czar em seu diário como “um tipo de padre socialista” – liderou milhares de homens desarmados, mulheres e crianças em direção ao centro da cidade, cantando hinos e carregando cruzes e cartazes religiosos. À medida que se aproximavam do Palácio de Inverno, tropas cossacas tentaram expulsá-los com chicotadas, mas a multidão era muito grande e muito determinada em seu objetivo para ser impedida por chicotes. Então os cossacos usaram seus rifles e espadas. Quando vários milhares de trabalhadores grevistas chegaram ao centro da cidade, determinados a ajudar a multidão a chegar ao Palácio de Inverno, a luta começou. Quando terminou, duzentos manifestantes jaziam mortos.” (Gilbert, Martin. A história do século XX. São Paulo : Planeta, 2016)


O episódio fez com que os trabalhadores perdessem definitivamente a confiança no regime, ocasionando o abandono da imagem do czar como “pai protetor do povo russo” e acentuando as greves e manifestações. O episódio fortaleceu, também, os bolcheviques, uma vez que a burguesia acabou apoiando a repressão aos trabalhadores. Ao Domingo Sangrento seguir-se-ia uma dura repressão aos socialistas e inimigos do regime, que resultou em algo em torno de 15 mil mortes e forçou várias lideranças ao exílio. 


Números oficiais divulgados em São Petersburgo, em 1909, revelaram que 782 infratores políticos haviam sido executados no ano anterior, o que representava um aumento de mais de cem em relação ao ano anterior. O número de exilados por ofensas políticas, principalmente na Sibéria, era de espantosos 180 mil.” (Gilbert, Martin. A história do século XX. São Paulo : Planeta, 2016)


Apesar da criação de uma Constituição e da Duma, o poder continuava centralizado nas mãos do czar. Para o czar, parecia que por muito tempo o controle político permaneceria em suas mãos. 


“A nova organização seria chamada de Conselho de Estado – Gosudarstvennaia Duma, em russo, conhecida simplesmente como Duma. Esse conselho seria responsável pelo “estudo preliminar e discussão das propostas legislativas”. Essas propostas, quando aceitas, seriam “submetidas à autoridade autocrática suprema”.


A promessa de uma assembleia eleita era uma grande concessão por parte do czar, mas uma decepção séria para os que queriam uma assembleia democrática com poderes legislativos, independente da autoridade do czar. Não somente a autoridade da Duma, como os direitos dos eleitores, estavam limitados: donos de propriedades podiam votar, assim como proprietários de estabelecimentos industriais e também camponeses. Mas tanto os trabalhadores quanto as classes profissionais, que tinham desempenhado um papel tão grande nas exigências pela reforma, foram excluídos. Em São Petesburbo com uma população de 1,5 milhão, haveria apenas 9.500 eleitores.” (Gilbert, Martin. A história do século XX. São Paulo : Planeta, 2016)


Como foi visto, a Rússia participou da Primeira Guerra Mundial ao lado da Tríplice Entente. A mobilização de 15 milhões de homens para o esforço de guerra acentuou as contradições internas. As condições dos combatentes eram péssimas, faltando condições básicas como botas, armas e alimentos. A guerra afundou a economia russa, arrasou a produção agrícola e mostrou-se um matadouro para os soldados. As manifestações a favor do fim da guerra se multiplicavam.


Mais de um milhão de soldados russos tinham sido mortos em ação. Mais de meio milhão estavam hospitalizados, feridos demais para voltar aos fronts. Além disso, mais de um milhão de soldados tinham desertado. O número de homens nas linhas de frente e nas unidades de reserva era insuficiente para atender as demandas dos campos de batalha em 1917.” (Gilbert, Martin. A história do século XX. São Paulo : Planeta, 2016)


O fim do regime czarista iniciou-se exatamente pela camada mais explorada do proletariado: as mulheres. No dia 8 de março de 1917, as tecelãs iniciaram uma manifestação que rapidamente se propagou por vários bairros de Petrogrado. Em poucos dias a mobilização alcançou o status de uma greve geral e desta vez, as tropas responsáveis pela repressão, começaram a aderir ao movimento contestatório, descumprindo as ordens do czar e entregando suas armas aos manifestantes. 


Na verdade, o governo do czar desmoronou quando uma manifestação de operárias (no habitual “Dia da Mulher” do movimento socialista — 8 de março) se combinou com um lock-out industrial na notoriamente militante metalúrgica Putilov e produziu uma greve geral e a invasão do centro da capital, do outro lado do rio gelado, basicamente para exigir pão. A fragilidade do regime se revelou quando as tropas do czar, mesmo os leais cossacos de sempre, hesitaram e depois se recusaram a atacar a multidão, e passaram a confraternizar com ela. HOBSBAWN, Eric. A era dos extremos: o breve século XX. 1941-1991.


Os acontecimentos se precipitaram rapidamente, com prédios públicos sendo incendiados, instalações estatais sendo tomadas pelos manifestantes, presos políticos sendo libertados, instalando o caos em Petrogrado. Em 12 de março a sede do parlamento russo foi tomada por uma multidão. O movimento se espalhou para outras importantes cidades russas, com a deposição das autoridades e o estabelecimento de novos sovietes (conselhos locais que representavam os operários, soldados e camponeses). 


No dia 15 de março o czar abdicou. Em menos de uma semana a dinastia dos Romanov, que governou a Rússia por mais de 300 anos, caiu, e meses depois a família do czar Nicolau II seria executada pelo novo regime.


“Iuróvski leu novamente a sentença de morte, e agora Alexei e os outros se persignaram enquanto Nicolau continuava dizendo: ‘O quê? O quê?’. ‘ ISTO !’, gritou Iuróvski, atirando no ex-tsar. O pelotão de fuzilamento ergueu as armas, apontou para a família e começou a disparar a esmo, com um ensurdecedor pandemônio de tiros, ‘gritos e gemidos de mulheres’, ordens bradadas por Iuróvski, pânico e fumaça. ‘Ninguém conseguia ouvir nada’, relembrou Iuróvski. Mas quando os disparos amainaram, eles perceberam que o tsarévitch Alexei e as mulheres estavam quase incólumes. De olhos arregalados, aterrorizado, perplexo e ainda sentado em sua cadeira, Alexei os observava através da fumaça dos disparos e da poeira da argamassa que quase extinguia a luz em meio à diabólica cena de cadeiras emborcadas, pernas se agitando, sangue e ‘gemidos, gritos, soluços abafados…’”(MONTEFIORE, Simon Sebag. Os Romanov: 1613-1918.)

O cartaz abaixo, da década de 1920 faz referência à possibilidade de uma revolução socialista à nível mundial.

Acima, a imagem faz uma referência a saída da Rússia em relação a Primeira Guerra Mundial a partir do momento em que os bolcheviques tomam o poder. 


Imago História

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