A Revolução Haitiana



Alguns anos após os Estados Unidos conquistarem a sua independência outra colônia pegaria em armas e desafiaria os europeus. Trata-se da parte ocidental da ilha de São Domingos, colônia dos franceses no Caribe, e grande produtora de açúcar, responsável por nada menos do que 75% do açúcar comercializado no mundo no final do século XVIII.

A população de Saint Domingue (a parte francesa da ilha) que chegava a 800 mil habitantes tinha mais de 80% de escravos e uma minoria de homens brancos. Essa minoria branca era chamada de grands blancs. Além dos escravos e dos grands blancs havia ainda uma classe de mestiços libertos conhecidos como affranchis tendo grande importância na economia da ilha.

Em 1791, inspirados na independência dos Estados Unidos (1776) e na Revolução Francesa (1789), os haitianos levantaram-se contra a discriminação entre homens livres, mulatos, negros e brancos. Os ecos da Revolução Francesa, com os ideais de igualdade e liberdade rapidamente chegaram a Saint Domingue, e em 1790 um grupo de affranchis liderados por Vincent Ogé e Jean Baptiste Chavenes acaba se insurgindo contra os brancos, mas a revolta é sufocada.

Em 1791 ocorre outro levante, desta vez dos escravos. Sob a liderança de Toussaint-Louverture, em poucos meses, a revolta chegou ao interior: os escravos abandonaram as fazendas, queimaram as plantações e mataram donos de terras e comerciantes. A situação ficou incontrolável quando as principais cidades foram ocupadas, o que obrigou os grands blancs e os affranchis a se unirem e solicitassem apoio da metrópole, que em resposta mandou 6 mil homens para tentar conter a revolução de escravos.

Nesse contexto, os espanhóis, que dominavam a outra metade da ilha aproveitam o momento de insurgência dos escravos para mobilizar tropas em direção ao território francês com o objetivo de unificar a ilha sob o seu domínio. O momento de instabilidade deu a deixa para que os ingleses, que ocupavam a vizinha Jamaica, tentassem invadir a ilha (interessados em reduzir o poderio francês e acabar com a revolução negra). Diante da ameaça britânica, haitianos e franceses fizeram uma trégua e repeliram os invasores.

Toussaint-Louverture derrotou as tropas espanholas, subjugou os grands blancs e ainda lutou contra tropas inglesas. Os espanhóis não só foram derrotados como cederam sua parte da ilha, a porção leste, para a França, em 1795.

A trégua entre franceses e os haitianos durou pouco. Em 1802, com Napoleão no poder, a França encaminha um grande exército composto por algo em torno de 50 mil homens, comandados pelo general Leclerc, cunhado de Napoleão.

Após derrotar as tropas de Napoleão em várias oportunidades, Toussaint-Louverture por meio de um acordo permitiu ser levado até a França, com o objetivo de negociar com Napoleão a autonomia da colônia. Acabou preso e morto em uma prisão francesa. Mesmo com a morte de seu principal líder a luta pela independência continuou e em 1804 os revoltosos derrotam definitivamente os franceses e proclamam a independência, dando para a região o nome de Haiti (nome dado pelos antigos habitantes da ilha, os índios arauaquis). Nascia a primeira nação negra livre da história, fruto da única revolta de escravos que deu certo.

O saldo de mortos chegou a 200 mil, mas a vingança viria de forma avassaladora. Ao processo revolucionário, seguiu-se um massacre da minoria branca, fazendo com que o exemplo de Saint Domingue passasse a ser temido pelos europeus. O “fantasma da revolução negra” e o massacre das minorias brancas vão assombrar as metrópoles europeias por décadas.

Por outro lado, após a conquista da liberdade, e o agora Haiti entraria em uma profunda crise econômica, perdendo o seu papel de destaque na produção de açúcar. Depois de anos de guerra as plantações e as cidades estavas destruídas. O comércio havia sido reduzido a quase nada.

Temerosos de que a rebelião de escravos se espalhasse continente afora, as potências europeias e os Estados Unidos não reconheceram a independência da nova nação, e para piorar a situação passaram a aplicar um embargo econômico aos haitianos, interrompendo todas as relações comerciais.

Instalou-se o caos econômico e político. Dos 23 governantes do Haiti que se seguiram até 1915, 19 foram destituídos ou assassinados, o país passou por guerras civis e golpes de Estado, numa incrível média de um a cada seis meses, além de uma invasão norte-americana que durou 19 anos (que ocorreu em 1915). Somente em dezembro de 1990 foi realizada a primeira eleição livre para presidente da história do Haiti.

Cronologia

1492 – Cristóvão Colombo é o primeiro europeu a aportar na ilha, batizada de Hispaniola.

1697 – A Espanha cede à França a parte oeste da ilha, ocupada por mercadores e piratas franceses.

1777 – As duas potências traçam a fronteira que vale até hoje no Tratado de Aranjuez.

1791 – Concedida a igualdade entre mulatos e brancos. Os escravos iniciam uma revolta.

1793 – Louverture é nomeado general e a escravidão é abolida nas colônias francesas.

1798 – Louverture comanda tropas de ex-escravos e expulsa os ingleses da ilha.

1801 – O novo país torna-se província autônoma da França e uma Constituição é promulgada.

1802 – Napoleão Bonaparte envia uma armada que vence as tropas de Louverture, que se entrega.

1804 – Depois de vencer as tropas francesas, os haitianos proclamam a independência.






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