Primeira Guerra Mundial (2 de 4) - As Alianças e o assassinato de Francisco Ferdinando

Entre os anos de 1871 e 1914 não ocorreram guerras que levaram as potências europeias a transpassar as suas fronteiras nacionais. Essa situação, contudo, estava prestes a mudar. Um iminente confronto entre as grandes nações imperialistas parecia para alguns apenas uma questão de tempo. 


Foi exatamente o que aconteceu em 1914. Existia uma grande tensão na região dos Bálcãs entre a Sérvia, que pretendia unir os povos eslavos da região, incluindo a Bósnia, e o Império Austro-Húngaro, que havia anexado à Bósnia em 1908.


Devido à tensão, o governo austro-húngaro enviou o herdeiro do trono, o arquiduque Francisco Ferdinando, e sua mulher, Sofia, a uma visita a Sarajevo, capital da Bósnia. Porém em 28 de junho, dia de sua chegada a Sarajevo, em meio às comemorações de um dia festivo para os sérvios, o casal é assassinado por um estudante ligado à organização secreta Mão Negra, grupo contrário aos planos do herdeiro do trono austro-húngaro e pró-Sérvia.  


O estopim da primeira guerra mundial ocorreu de forma inusitada. Chegando a Sarajevo de trem, Francisco Ferdinando e sua esposa saíram em um carro aberto até o local onde ocorreria a recepção oficial. Ao longo do percurso membros da organização Mão Negra estavam preparados com armas e bombas. Atacaram a comitiva, mas erraram o alvo acertando um dos carros que seguia a comitiva, mas sem qualquer dano ao arquiduque. Com a tentativa frustrada o grupo se dispersou, e Gavrilo Princip, tomava um café na rua Franz Joseph antes de partir. Horas depois, ao retornar da recepção, o carro de Francisco Ferdinando passou diante de Gavrilo, que sacou sua arma e atirou no casal ilustre, que morreu no caminho até o hospital. 




No total, oito homens foram presos. Gavrilo Princip foi condenado à pena máxima: 20 anos de prisão. O que ele desejava, no entanto, era morrer. "Minha vida já está arruinada. Eu sugiro que me preguem em uma cruz e me queimem vivo. Meu corpo em chamas será uma tocha para iluminar meu povo no caminho para a liberdade", declarou.



O império Austro-Húngaro esperou três semanas para levar a cabo sua retaliação (tempo necessário para organizar uma ação militar) e com o apoio incondicional da Alemanha (sua aliada) encaminhou um ultimato à Sérvia, com uma série de exigências, inclusive, outorgando-se o direito de interferir nas investigações que apuravam os responsáveis pelo assassinato de arquiduque com o respectivo julgamento dos culpados. A não aceitação de todos os termos do ultimato fez com que o Império Austro-Húngaro declarasse guerra à Sérvia, bombardeando a cidade de Belgrado. 


O ultimato austríaco foi entregue em Belgrado em 23 de julho. Ao relacionar o governo de Belgrado ao assassinato – algo que o relatório secreto de dez dias antes tinha especificamente negado –, insistia que o governo sérvio condenasse todo tipo de propaganda anti-Áustria e concordasse com a criação de uma comissão conjunta da Áustria e da Sérvia para investigar o assassinato de Franz Ferdinand. Deveria haver uma ordem militar da Sérvia condenando o envolvimento do exército sérvio nos assassinatos e uma promessa sérvia de não criar mais conspirações sérvias na Bósnia. A Sérvia deveria punir qualquer um que fizesse circular propaganda contra a Áustria em escolas ou em sociedades nacionalistas sérvias. Por fim, oficiais austríacos participariam no julgamento e punição daqueles envolvidos no planejamento do crime.


O governo sérvio sabia que, mesmo que a Rússia entrasse na guerra contra o Império Austro-Húngaro, a habilidade da Sérvia para resistir a um ataque devastador ao longo de suas fronteiras expostas era limitada. Então, enviou uma resposta conciliatória ao ultimato austríaco, concordando com todas as exigências que ele fazia. A única restrição referia-se à exigência de que oficiais austríacos participassem no julgamento e punição dos envolvidos no assassinato. Essa exigência, responderam os sérvios, deveria ser submetida ao Tribunal Internacional de Haia. Se o tribunal aceitasse sua legitimidade, a Sérvia concordaria em atendê-la.


A Sérvia tinha, efetivamente, se rendido. No entanto, em Berlim, o governo alemão pressionou os austríacos para atacar a Sérvia antes que maiores complicações surgissem. “Fomos compelidos a agir imediatamente e encarar o mundo com um ‘fato consumado’”, informou a Viena o embaixador austríaco em Berlim por telegrama no dia 28 de julho. Quando a Áustria declarou à Alemanha que seria preciso outras duas semanas para que a mobilização austríaca estivesse completa, os alemães pressionaram para que a Áustria não esperasse tanto tempo. Os ânimos em Berlim estavam predispostos à guerra, mas não intocados pelo medo. A Áustria deveria esmagar a Sérvia antes que os russos pudessem intervir e que a Alemanha fosse arrastada para a guerra em decorrência disso, não pelos seus interesses nacionais, mas pela sua aliança com a Áustria.


Os austríacos se lembraram de seu embaixador, o conde Giesl, de Belgrado. Mas será que a resposta conciliatória da Sérvia ao ultimato austríaco era motivo para a guerra? De repente, até o kaiser teve suas dúvidas, que foram expressadas de modo privado na manhã de 28 de julho, quando finalmente leu o texto completo da resposta sérvia – de três dias antes. Lendo o texto sérvio, lado a lado, com o texto completo do ultimato austríaco, ele não conseguia ver razão para a Áustria embarcar em um ataque de grande escala. “Uma grande vitória moral para Viena”, escreveu na margem da sua cópia da resposta sérvia, “mas com isso todas as razões para a guerra foram removidas, e Giesl deve permanecer, sem alardes, em Belgrado. Considerando a força desse documento, não poderíamos nunca ter ordenado a mobilização.”


Uma hora depois de o kaiser escrever essas palavras – “todas as razões para a guerra foram retiradas” –, a Áustria declarou guerra à Sérvia, confiante no apoio alemão caso a guerra se espalhasse. No dia 29 de julho, a flotilha naval austríaca no Danúbio abriu fogo contra Belgrado”. (Gilbert, Martin. A história do século XX. São Paulo : Planeta, 2016)


A partir desse momento as alianças foram automaticamente acionadas: a Rússia, aliada da Sérvia, coloca seu exército em ação, deslocando tropas para os Bálcãs; a Alemanha responde imediatamente aos russos e coloca suas tropas em marcha, atravessando o território belga (que interessava a Alemanha, mas se colocava como um país neutro); é a vez, então, da França e do Império Britânico socorrerem a Bélgica. 


O início da guerra coloca em funcionamento dois poderosos blocos de alianças que já haviam sido formados: 


  • De um lado os países da Tríplice Aliança (formada em 1882) por Alemanha, Itália (que se declarou neutra no início dos conflitos), Império Austro-Húngaro e o Império Otomano (que entrou na aliança em 1914, após o início da guerra).


  • Do outro lado, a Tríplice Entente (formada em 1907), com Inglaterra, França, Rússia e o Japão (que entrou em 1914, também após o início dos confrontos). 


O pavio havia sido acesso, e daquele momento em diante a guerra envolveria todas as grandes potências. A “era da catástrofe” estava apenas começando.


Na imagem temos uma sátira que é favorável à Alemanha, onde a Rússia a França e a Grã-Bretanha aparecem como os “pacíficos amigos”. É claro, o que a caricatura pretende é realçar exatamente o contrário, ou seja, a suposta responsabilidade desses países no conflito.

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