República Velha (2 de 3): A “República da Espada”, Encilhamento, Constituição de 1791 e Revolução Federalista



A instauração da República no Brasil em 1889 não significou uma alteração significativa das estruturas do país, que incorporasse, por exemplo, as camadas mais baixas no processo eleitoral. Ao contrário, procurou-se privilegiar os setores agrários e a principal cultura de exportação: o café. 

No momento da proclamação da república existiam diversos grupos políticos com interesses e projetos bastante distintos para o Brasil. 

De um lado existiam as oligarquias de São Paulo (com o Partido Republicano Paulista, PRP, fundado em 1873) e de Minas Gerais, que defendiam o federalismo (com grande autonomia para os estados) e o liberalismo americano (sem grandes intervenções do Estado regulando a economia e na vida das pessoas). 

Existia também o chamado Jacobinismo, formado por republicanos radicais entre eles civis e militares, que defendiam a participação dos cidadãos no governo. 

Deve-se destacar ainda a participação dos positivistas em especial no Rio Grande do Sul, que defendiam a instauração de uma ditadura republicana, com um executivo forte e um Estado intervencionista. 

A “República da Espada”

Os primeiros anos republicanos foram marcados pelo que conhecido como “República da Espada”, que nada mais é do que a consolidação da república no Brasil, comandada pelos dois grupos republicanos mais organizados, ou seja, o PRP e o exército, este último tendo como representantes mais ilustres o Marechal Deodoro da Fonseca e Marechal Floriano Peixoto. 

Deodoro, que havia liderado o golpe que levou a proclamação da República foi escolhido como comandar o governo provisório. Em 1790 foi convocada a Assembleia Nacional Constituinte e em 24 de fevereiro de 1891 foi promulgada a Constituição republicana. Entre as principais características da nova carta magna, pode-se destacar:

Adoção da descentralização política e do federalismo, com autonomia para os estados, que poderiam eleger seus governadores e deputados, além de criar alguns impostos próprios e manter forças militares. 

Adoção dos três poderes e o sistema presidencialista. 

Sufrágio masculino com voto não secreto para maiores de 21 anos alfabetizados (excludente, a constituição sequer mencionava as mulheres, e excluía participação de mendigos, soldados estrangeiros e membros de ordens religiosas). 

Separação entre a Igreja e o Estado, com a instituição do casamento civil e liberdade de culto. 

O começo da Primeira República é marcado pelo que ficou conhecido como Encilhamento. Primeiramente, cabe destacar que encilhamento é um nome negativo, dado pelos críticos da política econômica vigente, fazendo uma analogia com o momento em que se preparavam para dar a largada nas corridas de cavalos, momento de extrema tensão em que todos têm em perspectivas as suas apostas.

Na verdade, trata-se de uma política de emissão de dinheiro em grande quantidade, para por um lado, compensar o aumento da demanda por papel-moeda na medida em que, principalmente com o fim da escravidão e a imigração, estava ocorrendo um incremento no mercado consumidor brasileiro, e por outro, incentivar o surgimento de empresas e indústrias por meio de empréstimos. Ou seja, com a instauração da República e com a crise do preço do café no final do século XIX, o encilhamento nada mais era que uma tentativa de estimular o consumo e a indústria no Brasil. 

Comandada por Rui Barbosa, então ministro da fazenda, os bancos foram autorizados a emitir papel moeda e conceder grandes empréstimos. As novas empresas, por sua vez, foram autorizadas a lançar suas ações na Bolsa de Valores. 

Emprestava-se dinheiro sem nenhum controle, a qualquer um, correndo-se grandes riscos de nunca mais recuperar esse investimento. Bastava ter uma ideia em relação ao “desenvolvimento” do Brasil (e nem havia necessidade de ser uma “grande ideia”) e um pouco de influência, que você se tornaria um grande candidato a pleitear grandes volumes de capital.

Como existia grande oferta de papel moeda, muitos passaram a comprar muitas ações na Bolsa em uma corrida especulativa (daí a analogia com encilhamento). Quando os investidores perceberam que boa parte das ações negociadas era de empresas “fantasmas” o governo cortou a concessão de créditos e o pessimismo levou os investidores a retirar suas ações ocasionando a quebradeira das empresas.

Com a Constituição de 1981 os poderes do então presidente Deodoro eram limitados: ele deveria dividir o poder com o Congresso e o judiciário. Essa nova situação política não tardaria a se acentuar em um conflito entre os políticos liberais e a imprensa e, de outro lado, Deodoro e parte dos setores militares, que ansiavam por maior centralismo político. 

Deodoro acabou por destituir do poder os governadores que eram opositores e com apenas oito meses de governo fechou o Congresso Nacional e decretou estado de sítio. A oposição reagiu ao golpe, até mesmo os setores militares que apoiavam Floriano Peixoto não concordaram com as atitudes autoritárias e pressionado Deodoro renuncia a presidência em 23 de novembro de 1791, deixando o posto livre para o vice-presidente Floriano Peixoto assumir o poder no mesmo dia. 

Contudo, de acordo com a Constituição, Floriano Peixoto deveria convocar novas eleições para eleger um novo presidente (o vice somente poderia assumir o poder se o presidente tivesse cumprido metade do seu mandato, o que efetivamente não ocorreu) o que não fez, com o intuito de permanecer no poder. Mandou prender generais opositores e minimizar as oposições dentro do exército, e por outro lado, procurou se aproximar do PRP o que lhe garantiu importante sustentáculo politico. Mesmo assim explodiram as oposições contra o regime.

Em setembro de 1893 a Marinha de guerra torna-se a principal oposição ao governo. Comandada pelo contra-almirante Custódio de Melo os navios de guerra posicionados no Rio de Janeiro se rebelam contra o governo e passam a bombardear a cidade: a Revolta da Armada estava em curso. 

Depois de meses, sem conseguir desembarcar na capital parte dos revoltosos pediu asilo político a Portugal, enquanto outra parte partiu para o sul do país tomando a capital de Santa Catarina (então chamada Desterro) e se unindo aos gaúchos que pouco tempo antes haviam iniciado uma guerra civil no Rio Grande do Sul, a chamada Revolução Federalista. 

No Rio Grande do Sul existiam dois grupos políticos antagônicos, o Partido Federalista, liderado por Gaspar Silveira Martins que defendia o parlamentarismo e uma maior centralização de poder por parte do executivo; e como grupo opositor, o Partido Republicano Rio-Grandense, partidários de um governo estadual independente. 

Com a República o Partido Rio-Grandense liderado por Júlio de Castilho alcançou o poder, governando de forma autoritária em eleições permeada por fraudes e violência. Insatisfeitos os federalistas se uniram dando início a uma sangrenta guerra civil que vai se estender de 1893 a 1895.

Como os federalistas estavam concentrados em uma região do Uruguai onde viviam colonos originários da Maragateria, na Espanha, doravante passaram a ser denominados “maragatos”. Por sua vez, os republicanos passaram a ser chamados de “pica-paus” em provável alusão ao chapéu usado pelos soldados republicanos com uma ponta fina e cumprido como a de um bico. 

A guerra logo adquiriu âmbito nacional, ameaçando a estabilidade do governo rio-grandense e o regime republicano em todo o país. Para conter os avanços dos maragatos Floriano Peixoto enviou tropas para socorrer Júlio de Castilhos.

Foram estrategicamente organizadas três divisões, chamadas de legalistas: a do norte, a da capital e a do centro. Além destas, foi convocada a polícia estadual e todo o seu contingente para enfrentar o inimigo.

Depois de vitórias no sul os maragatos rumaram em direção ao norte avançando sobre Santa Catarina e chegando ao Paraná, sendo detidos na cidade da Lapa, a sessenta quilômetros de Curitiba. A obstinada resistência oposta às tropas federalistas na cidade de Lapa (Paraná), pelo Coronel Carneiro, frustrou as pretensões rebeldes de chegarem à capital da República, no que ficou conhecido como o “Cerco da Lapa”.

Ao longo da Revolução, os maragatos tiveram apoio constante da província de Corrientes, na Argentina e também no Uruguai. O que lhes permitiu contrabandear armamento através da fronteira, praticar incursões táticas em território estrangeiro a fim de fugir de perseguições, bem como, refugiar-se nos países vizinhos em momentos de desvantagens frente a inimigo.

A revolução federalista foi derrotada em de junho de 1895, no combate de Campo Osório, quando o almirante Saldanha da Gama, possuidor de um contingente de 400 homens, 100 deles marinheiros, lutou até a morte contra os Pica-paus. Estima-se que tenham morrido nos conflitos pelo menos 10 mil pessoas, muitas vítimas da prática de degola que adquiriu durante o conflito um caráter “revanchista”.

Acompanhada de zombarias e humilhações à prática da degola às vezes era acompanhada da castração. Assemelhando-se a degola da ovelha durante a degola a faca era passada de orelha a orelha, com a vítima ajoelhada, amarrada, e com a cabeça estendida para trás. 


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