O Estado no Brasil colônia


Durante séculos o Brasil esteve ligado a Portugal através do Pacto Colonial onde prevalecia uma relação de poder assimétrica entre metrópole e colônia, sendo que Portugal tinha o exclusivismo comercial em relação ao Brasil. Todas as decisões cabiam à monarquia portuguesa, que a partir das premissas do Estado absolutista tinha como principal objetivo a política mercantilista de acumulação de capitais.

No inicio da colonização, como a Coroa portuguesa não tinha recursos para explorar o território optou-se por descentralizar a administração da América portuguesa através das Capitanias Hereditárias. Através desse sistema o território português foi dividido em parcelas de aproximadamente 300 km de faixa litorânea. Esses amplos territórios foram distribuídos a donatários, indivíduos da pequena nobreza ou funcionários do governo que estavam interessados em colonizar o Brasil.

Através das Cartas de Doação a coroa concedia a capitania ao donatário e estabelecia os poderes que ele teria em seus domínios. Outro documento, o Foral, dizia respeito aos direitos e alguns deveres que esses donatários teriam. Como o objetivo da coroa era atrair pessoas que estivessem interessadas em investir na colonização, esses documentos davam amplos poderes, que poderiam ser utilizados pelo donatário para escravizar e vender indígenas, julgar os habitantes da capitania (inclusive com condenação à morte), fundar vilas e organizar a capitania militarmente, e doar sesmarias (grandes extensões de terras).

As Capitanias Hereditárias não obtiveram o sucesso esperado, e a coroa portuguesa resolve mudar a sua política, e estabelece a criação do Governo-Geral, com a função de centralizar o poder, organizar e prover apoio às Capitanias. Desta forma é escolhida a Capitania de Todos os Santos para ser a sede do governo, fundando-se a cidade de Salvador, em 1549.

Entre as principais características da colonização implantada no Brasil, pode-se citar:

  • “Pacto Colonial”. Através dessa relação desigual entre colônia e metrópole assegurava-se o exclusivismo comercial, ou seja, Portugal tinha o monopólio da compra da produção colonial e, igualmente da venda de mercadorias na América portuguesa. 

  • A produção era destinada ao mercado externo. A colonização portuguesa tinha um caráter de complementaridade, ou seja, os recursos oriundos da exploração se destinavam ao mercado externo, complementando a economia metropolitana.

  • Como o objetivo era lucrar, os portugueses desenvolveram culturas em larga escala e com baixo custo produtivo, ou seja, se utilizaram dos chamados latifúndios (grandes extensões de terras), com o desenvolvimento da monocultura. Ao optar pela monocultura, a coroa portuguesa inviabilizou em grande parte o desenvolvimento de um mercado interno que tivesse como base as pequenas e médias propriedades.

  • Utilização preponderante da mão-de-obra escava africana, negócio altamente lucrativo.

  • Por fim, altamente nocivo ao desenvolvimento colonial, à metrópole adotou a proibição em relação à instalação de manufatoras (com exceção da atividade manufatureira que envolvia a produção da cana-de-açúcar). O objetivo era garantir, através do Pacto Colonial a venda de mercadorias sem qualquer tipo de concorrência por parte dos colonos.

Em 1807 ameaçado de um lado pela França de Napoleão – e a exigência de que Portugal aderisse ao Bloqueio Continental – e de outro pela Inglaterra, o príncipe regente D. João VI resolve transferir toda a Corte portuguesa para o Rio de Janeiro (capital do Brasil desde 1763). 

A Corte, boa parte da burocracia estatal portuguesa, os principais bajuladores e ineptos que rodeavam o então príncipe regente D. João, além de boa parte do tesouro de Portugal transladariam o Oceano Atlântico, enfrentariam Adamastor (o mar Oceano) – que já não assustava tanto – e, pela primeira vez na história das monarquias europeias, um rei colocaria os seus pés em uma de suas colônias.   

Afora os percalços e incertezas por parte tanto dos lusitanos como dos brasileiros, com a chegada da Corte portuguesa ao Brasil, uma certeza ao menos se anunciava: o Brasil não aceitaria mais a sua condição de subalterno. A Abertura dos Portos para o comércio com as nações amigas (leia-se Inglaterra), ainda na passagem pela Bahia, é apenas um dos passos de um processo que irá culminar na ruptura dos laços entre metrópole e colônia.

É importante destacar que tendo em vista o processo de independência das colônias americanas o Brasil vai ocupar um lugar singular. Se nas colônias espanholas e inglesas o distanciamento entre metrópole e colônias (em face da expansão napoleônica ou da noção de autogoverno das colônias norte-americanas, em especial as do centro-norte) vai precipitar em guerras de independência, no Brasil, a transferência da Corte, levará o Brasil a uma ruptura dos laços com Portugal gerido pela própria monarquia, preservando a unidade territorial brasileira e o regime monárquico.

Ao mesmo tempo, as relações de dependência para com a Inglaterra foram transferidas para o Brasil, o que se manteria mesmo após a independência do Brasil. Com a chegada da Corte ocorrem alterações importantes no Brasil, com a liberação das manufaturas, criação de instancias jurídica, administrativa e cultural, como o Real Hospital Militar, a Escola de Ciências, Artes e Ofícios; a contratação da Missão Artística Francesa em 1816 (com inúmeros artistas franceses, que serviram a Napoleão e posteriormente caíram em desgraça); a criação da Imprensa Régia; a criação do Real Erário; a fundação do Banco do Brasil, criação da Junta de Comércio, Agricultura, Fábrica e Navegação; a Biblioteca Real; o Jardim Botânico, fábricas de pólvora, etc.

Enquanto D. João VI se mantinha longe das turbulências europeias, os portugueses se organizavam numa épica luta de resistência contra as tropas de Napoleão. Com a ajuda dos ingleses, os portugueses conseguirão expulsar os franceses (nessa que é a primeira vitória inglesa no continente em mais de 50 anos) e repelir outras tantas tentativas de invasão das tropas francesas.

Para quem havia ficado em Portugal o sentimento era de que o rei havia abandonado o seu reino, deixando os portugueses à sua própria sorte. Esse sentimento de insatisfação ou mesmo de revolta vai se acentuar a partir de 1815, quando Napoleão é derrotado definitivamente, mas mesmo assim o rei insiste em permanecer no Brasil.

Esse novo contexto irá dar origem a Revolução Constitucionalista de 1820 (Revolução do Porto), quando setores sociais portugueses, em especial a burguesia mercantil, exigia a constitucionalização do reino, ou seja, a elaboração de uma constituição liberal que limitava o poder do rei.

Entre os decretos das Cortes se estipulou o imediato retorno de D. João VI a Portugal, além de medidas que visavam o retorno do Brasil a sua condição subalterna, com a supressão dos tribunais e de todos os órgãos públicos que haviam sido criados a partir da chegada de D. João, além da subordinação das tropas militares brasileiras a Portugal.

Pressionado pelas Cortes, D. João retorna a Portugal no dia 26 de abril de 1821 (levando consigo todo o ouro e joias depositados no Banco do Brasil, além de quatro mil cortesãos, muitos ineptos e bajuladores), nomeando como regente do Brasil o seu filho e herdeiro D. Pedro. 

Entre as questões e perspectivas que rondavam o processo emancipatório podemos destacar:

  • Havia a insatisfação da aristocracia rural brasileira em relação às intenções recolonizadoras de Portugal, o que fez com que D. João VI deixasse no Brasil ninguém menos que o príncipe herdeiro.

  • Existia o exemplo das guerras de independência em toda a América Espanhola, que incendiava a mente e o coração de muitos republicanos no Brasil.

  • O medo de setores no Brasil, inclusive daqueles que eram a favor da ruptura com Portugal, de convulsões sociais, a exemplo do Haiti, que conseguiu a sua independência em 1804 com o massacre das elites brancas (derrotando tropas francesas e inglesas e espanholas).

Em setembro de 1822 Lisboa vai exigir o retorno de D. Pedro ameaçando-o de afastá-lo da sucessão ao trono de Portugal, e destituindo-o de seus poderes enquanto príncipe regente. É nesse ínterim, que no dia 7 de setembro de 1822, nas margens do riacho do Ipiranga, ouvindo as aclamações de seus conselheiros mais próximos, como José Bonifácio (que por isso se tornaria o patriarca da independência) que D. Pedro declara “É tempo (...) independência ou morte (...) estamos separados de Portugal”. 

Atendia-se aos interesses conciliadores de parte das elites locais, mantendo o país liberto unido em torno da figura maior do monarca brasileiro, caso único em toda a América, preservando a unidade territorial, e sufocando posteriormente qualquer tentativa de ruptura ou projetos provinciais e ao mesmo tempo apagando-se a possibilidade de revoltas negras como no caso do Haiti. Esse “arranjo político” caracterizou-se por:

  • Preservar o regime monárquico.
  • Manutenção da estrutura latifundiária.
  • Preservação do trabalho escravo.
  • Exclusão política das camadas populares
  • Eliminação de todos os movimentos de contestação e revoltas separatistas.
 

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